segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Como a ladroagem mata uma boa ideia

Folha de São paulo - 24/10/2011
Todos estão falando do desvio de recursos do Ministério dos Esportes. Mas o que me incomoda, ainda mais do que o dinheiro desviado, é como a ladroagem mata uma boa ideia, capaz de ajudar quem tem pouco ou nada.
E o Segundo Tempo, programa que serviu de base para gatunagem, é uma boa ideia.
Sempre defendi que o processo educativo deveria deixar os estudantes mais tempo na escola e usando todos os espaços possíveis da comunidade. Sabemos que em comunidades pobres a violência é provocada também pela falta de lazer. Vemos, em várias partes do mundo, como o esporte serve para ajudar a paz em bairros conflagrados.
Gosto ainda mais da ideia da escola servir como articuladora de espaços na comunidade. Quando tanto se fala em aumentar o horário escolar, o esporte é mais uma das atividades possíveis.
Como a escola não tem condições de administrar todo esse processo, o óbvio é chamar entidades comunitárias.
A corrupção trouxe desconfiança sobre todo o programa, atingindo os mais pobres.
Esse é o pior preço de todo esse caso de corrupção --e isso não tem preço.

Gilberto Dimenstein, 54, integra o Conselho Editorial da Folha e vive nos Estados Unidos, onde foi convidado para desenvolver em Harvard projeto de comunicação para a cidadania.

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Entre Wall Street e a Idade da Pedra

20/10/2011 - Folha de São paulo

http://www1.folha.uol.com.br/colunas/helioschwartsman/993398-entre-wall-street-e-a-idade-da-pedra.shtml

A pedidos, comento as manifestações da família do "Ocupe Wall Street" que estão se espalhando pelo mundo. Acredito que elas podem ser úteis, enquanto ajudarem governos esclarecidos a impor uma regulação mais sábia sobre os mercados financeiros. Não é preciso ter pós-graduação em economia pelo Instituto Lênin para reconhecer que, em determinados setores, o Estado precisa criar mecanismos que moderem os apetites de agentes privados, sob pena de produzir megaconfusões como a crise de 2008, cujas consequências o planeta amarga até hoje. 

Outro ponto interessante é que esse tipo de movimento, à medida em que lança legiões de jovens numa reflexão sobre o papel das instituições, contribui para arejar e até mesmo desfossilizar a ação política. É em ocasiões como essas que demandas das próximas gerações são incorporadas ao "Zeitgeist", o horizonte de preocupações de uma época.
Isso dito, passo ao que há de preocupante nesses protestos. Eles se sustentam em algumas das forças mais retrógradas da psique humana, que, no passado remoto e recente, coadjuvaram em vários tipos de massacres e genocídios.
Prossigamos com vagar e cuidado, começando pelas noções intuitivas de economia que estão na base das manifestações. Nossos cérebros foram moldados para operar no paleolítico. Ali, as trocas, quando havia, eram todas na base do olho por olho, dente por dente, isto é, um bem concreto, como, digamos, uma caverna confortável por uma mulher, ou uma vaca e três galinhas ou outros produtos e serviços bastante concretos. Nossa psicologia tem dificuldade para lidar com as abstrações matemáticas envolvidas na economia moderna, como dinheiro, lucro, juros, para não mencionar verdadeiros desafios lógicos, como o mercado de derivativos e as alavancagens financeiras.
O resultado é que não temos nenhuma dificuldade para ver operários, artesãos e fazendeiros como produtores de valor. Eles, afinal, transformam coisas de menor valor em alimentos ou objetos dos quais temos necessidade para sobreviver.
O mesmo não se aplica a comerciantes e outros intermediários, aos quais chamamos pejorativamente de "atravessadores" --como se a logística de levar produtos das fábricas e hortas para as gôndolas dos supermercados não valesse nada.
Em pior situação ainda estão os pobres banqueiros (nunca achei que utilizaria o adjetivo ªpobresº para qualificar o substantivo ªbanqueirosº, mas para tudo há uma primeira vez). Para nossos cérebros pré-históricos, emprestar dinheiro a juros é muito mais uma exploração do que um serviço. Quase nunca nos vem à mente que os níveis historicamente extraordinários de riqueza global de que hoje desfrutamos, que podem ser medidos em termos de calorias por habitante e até de expectativa de vida, só se tornaram possíveis graças ao comércio e aos mecanismos financeiros.
E, como mostra o psicólogo evolutivo Steven Pinker no recém-lançado "The Better Angels of Our Nature: Why Violence Has Declined" (os melhores anjos de nossa natureza: por que a violência diminuiu), essa indisposição quase neurológica para com intermediários tem complexas implicações sociais.
(A propósito, este novo livro de Pinker é uma das obras mais estimulantes obras que li nos últimos anos. Ainda estou na metade do catatau de quase mil páginas. Prometo uma resenha mais substanciosa assim que terminá-lo).
É muito fácil, diz Pinker, transferir a antipatia em relação a um comerciante ou banqueiro em particular para um grupo étnico. Essas atividades não exigem a possessão de terra ou fábricas. Elas dependem principalmente de conhecimento, que é algo que pode ser passado com certa facilidade para familiares e amigos. Igualmente importante, a expertise é portátil. Essas características fizeram com que alguns grupos étnicos se especializassem em atividades intermediárias, mudando-se para comunidades que delas tinham necessidade. Logo, tornaram-se minorias prósperas, virando alvo de inveja e ressentimento.
Não é uma coincidência que esses grupos tenham sido vítimas preferenciais de discriminação, expulsões e mesmo genocídio. O caso dos judeus na Europa é bem conhecido, mas está longe de ser o único. Também experimentaram perseguições os indianos no leste da África e na Oceania, os armênios na Turquia, os ibos na Nigéria, os chineses na Indonésia, Malásia e Vietnã, e várias minorias burguesas na União Soviética, na China e no Camboja.
Mais do que acidentes históricos, as agressões a que esses e outros grupos foram submetidos têm raízes em nosso essencialismo, sustenta Pinker. Intuições econômicas fora de lugar nos fazem ver comerciantes e banqueiros como aproveitadores. Muitas vezes, apenas pensar em pessoas enriquecendo à custa de outras já produz em nossos cérebros a emoção do desgosto. Mas é porque temos a tendência de procurar uma natureza secreta por trás das coisas (o essencialismo) que rapidamente estendemos a sensação de aversão originada por um intermediário em particular a todos os demais membros da categoria, que por acaso equivale a um grupo étnico. Também por uma operação de generalização, o desgosto é elevado do plano físico para o moral.
Ditadores e todos aqueles interessados em perseguir uma minoria raramente têm dificuldade em fazer com que a população passe a ver o alvo como uma categoria moralmente diferenciada, sempre descrita através de metáforas que evocam a emoção do desgosto: ratos, insetos, piolhos, predadores, vermes, sanguessugas, parasitas, baratas são alguns dos termos historicamente utilizados para referir-se aos membros do grupo perseguido.
Só que, como nota Pinker, grupos étnicos rivais podem passar décadas ou mesmo séculos desconfiando um do outro sem se matar, ou ao menos sem fazê-lo em larga escala. Para transformar a competição em um grande genocídio é preciso trazer mais um elemento: a ideologia, que pode assumir roupagens religiosas, políticas, nacionalistas ou ainda uma mistura disso tudo.
A ideologia nesse sentido amplo opera como um gatilho porque ela introduz a noção de utopia, a ideia de uma sociedade perfeita ou quase onde todos serão infinitamente felizes, seja no outro mundo, no paraíso socialista ou no Reich de mil anos. Passa a valer, então, o cálculo utilitarista. Se é uma minoria que se põe no caminho entre o aqui e a perfeição absoluta, torna-se lícito eliminar os representantes desse grupo. Em alguns casos, notadamente no universo religioso, essa licitude vira até um imperativo moral: manda-se o herege para a fogueira para salvar-lhe a alma imortal.
Nada indica que os estudantes acampados em Wall Street sairão por aí queimando banqueiros ou os enforcando nas tripas de comerciantes. Por enquanto, vale a avaliação inicial de que esses movimentos mais contribuem com as democracias do que as desestabilizam. Mas, antes de aplaudi-los e apoiá-los incondicionalmente, é bom ter em mente que eles também exprimem forças profundamente reacionárias de nosso psiquismo. A depender delas, prevaleceria um igualitarismo primitivo baseado no escambo e na aversão às tecnologias. Em suma, ainda estaríamos na Idade da Pedra.
Hélio Schwartsman Hélio Schwartsman, 44, é articulista da Folha. Bacharel em Filosofia, publicou "Aquilae Titicans - O Segredo de Avicena - Uma Aventura no Afeganistão" em 2001. Escreve para a Folha.com às quintas-feiras.

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Não gosto do Dia do Professor por Gilberto Dimenstein

13/10/2011 - 08h57

Não gosto do Dia do Professor

Não gosto do Dia do Professor, a ser comemorado no próximo sábado, por um único motivo: é um dia pouco comemorado. Deveria merecer mais, muito mais atenção, do país. Quase passa despercebido.
Não há nenhuma profissão tão importante para uma sociedade que se proponha a ser civilizada. É mais importante do que a medicina, que salva vidas, afinal quem forma o médico é o professor.
Nada deveria ser tão importante para uma nação do que saber atrair seus melhores talentos para ajudar a disseminar e produzir conhecimento. O que exige uma série de ações coordenadas e complexas. Isso significa que, no final, a pessoa tem de ter orgulho de ter essa carreira.
Não é o que ocorre. Estamos longe, muito longe, de recrutar os melhores talentos. Os salários não são atrativos. As condições de trabalho são péssimas, para não dizer vergonhosas.
Justamente por ter essa visão é que, aqui nesse espaço, faço questão de provocar polêmicas, não apenas criticando os governos, mas também, muitas vezes, quem se dispõe a defender os professores, esquecendo-se do mérito.
Há uma série de demandas corporativas que apenas se encaixam nesse ambiente de degradação. Basta lembrar quantas vezes dirigentes sindicais, sem a menor preocupação com o mérito, atacaram e atacam esforços para reduzir o absenteísmo, demitir professores sem condições de trabalhar ou exigir maior desempenho. Sem contar o explícito uso da máquina sindical para fazer política. Isso, para mim, apenas degrada a imagem do professor. Assim como os governos também usam a educação para fazer política eleitoral.
Some-se a isso que, apesar de todos os avanços, as famílias e a opinião pública pouco acompanham a educação pública. Um sinal de ignorância vemos nas pesquisas que indicam a satisfação dos pais com o ensino público.
Uma medida da nossa civilidade poderá ser medida pela atenção e reverência que se tenha no Dia do Professor.
Gilberto Dimenstein
Gilberto Dimenstein, 54, integra o Conselho Editorial da Folha e vive nos Estados Unidos, onde foi convidado para desenvolver em Harvard projeto de comunicação para a cidadania.

terça-feira, 16 de agosto de 2011

Se a lei é para todos, a indignação contra seu desrespeito também deve ser geral

A presidente Dilma Rousseff considerou "inaceitável" a divulgação de fotos dos presos na Operação Voucher, realizada pela Polícia Federal, que resultou na prisão de 36 pessoas acusadas de envolvimento em irregularidades no Ministério do Turismo. A informação foi prestada nesta sexta-feira, 12, pelo porta-voz do Planalto, Rodrigo Baena Soares.
O Planalto informou ainda que o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, considerou o vazamento das fotos "uma violação do princípio da dignidade do preso".
(...).
Mais cedo, o ministro da Justiça encaminhou ofício ao presidente do Supremo Tribunal Federal, Cézar Peluso, pedindo que o Conselho Nacional de Justiça tome providências sobre o vazamento das fotografias dos presos na Operação Voucher. Os detidos aparecem nas imagens sem camisa e segurando placas de identificação.
O Palácio do Planalto informou também que, em resposta ao ofício de Cardozo, Cézar Peluso disse ao ministro da Justiça que vai encaminhar a denúncia ao Ministério Publico, ao governo estadual e à Vara de Execuções de Macapá. (Fonte: http://www.estadao.com.br/noticias/nacional,dilma-considera-inaceitavel-divulgacao-de-fotos-de-presos-do-turismo,757878,0.htm).

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Tiririca diz que Câmara é uma fábrica de loucos

11/08/2011 - 09h36
DE SÃO PAULO
Oito meses depois de assumir o mandato, o palhaço Tiririca já sabe responder o que faz um deputado federal, informa a coluna de Mônica Bergamo, publicada na edição desta quinta-feira da Folha (a íntegra está disponível para assinantes do jornal e do UOL, empresa controlada pelo Grupo Folha, que edita a Folha).
"É uma pessoa que trabalha muito e produz muito pouco".
Isso porque a Câmara, na opinião dele, "é uma fábrica de loucos. Uma fábrica de loucos".
Ele conta que os parlamentares muitas vezes varam as madrugadas em discussões intermináveis em que "ninguém escuta ninguém".

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

A última sessão de Ellen Gracie


Data: 05.08.11

Onze anos depois de ingressar no STF sob o status de primeira mulher a ter assento na corte, Ellen Gracie Northfleet participou ontem (4) de sua última sessão plenária. Ela relatou a maior parte dos processos apreciados na tarde de ontem e chegou a antecipar seu voto em um processo em que houve pedido de vista.

Ao deixar o plenário, Ellen não se despediu dos colegas nem fez referências à sua saída. Ela aguarda a publicação da aposentadoria no Diário Oficial da União, prevista para segunda-feira.

Além de primeira ministra do Supremo, Ellen Gracie foi a primeira mulher a presidi-lo, entre abril de 2006 e abril de 2008. Indicada pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso, em 2000, para o cargo no STF, Ellen poderia continuar na corte até fevereiro de 2018, quando completará 70 anos - idade em que a
aposentadoria é obrigatória.

Ela continuará recebendo salário de R$ 26.723 mil brutos - normal para um(a) ministro(a) que se aposenta.


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Curiosidades: O crime em forma de poesia


Data: 05.08.11


O delegado Reinaldo Lobo, da 29ª DP, no Riacho Fundo (DF), a 18 km de Brasília, surpreendeu algumas pessoas ao registrar um crime de receptação em forma de poesia.

O documento apresentado faz parte do inquérito policial, formado também pelo auto de prisão em flagrante, as oitivas e o relatório. A peça final, única feita em poesia, não foi aprovada e teve que ser refeita.

Os versos começam assim:

"O preso pediu desculpa /
 disse que não tinha culpa /
 pois estava só na garupa /
 foi checada a situação /
 ele é mesmo sem noção /
 estava preso na domiciliar /
 não conseguiu mais se explicar".

Mais adiante, o delegado prossegue:

"Se na garupa ou no volante /
 sei que fiz esse flagrante /
 desse cara petulante /
 que no crime não é estreante".

E por aí se foi.

Procurado por jornalistas do DF, o policial explicou, em prosa,  que "a vontade de fazer um trabalho diferente motivou a redação do poema".

E justificou: “O nosso trabalho é um pouco de idealismo. Apesar de muito árduo, ele é um pouco de fantasia, de você lutar pela reconstrução e pela melhora do mundo. Isso traz muita realização e eu quis transformar isso em arte, daí a ideia da poesia”.

Ele também disse que sua intenção era chamar a atenção de quem fosse ler o inquérito. "Deparamo-nos com situações difíceis. Naquela noite, tive vontade de transmitir uma mensagem a quem fosse ler aquelas peças”.

Apesar da criatividade, o relatório foi do Foro para a Corregedoria, de onde retornou com uma determinação para que fosse escrito nos padrões da polícia.

Lobo achou melhor solicitar o ajuste a outro delegado. “Não existe nada que regre a redação oficial de um relatório. O Código de Processo Penal só exige que se narre o caso e se citem as informações importantes. O delegado deve ter liberdade de fazer isso”, defendeu.

Foi a primeira vez que Lobo escreveu um relatório em poesia. Apesar de o formato não ter sido aceito, ele diz que não abandonou completamente a ideia.

“Vou tentar um diálogo com a Corregedoria /
 para ver o que é possível fazer em harmonia” -
arrematou, fazendo nova rima.


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